Colapso Climático
Empresa da carne lucra com créditos de carbono sem zerar desmatamento
Projetos de carbono pouco transparentes de subsidiária da Minerva Foods dão à indústria do petróleo um álibi para manter atividades que, pela emissão de gases de efeito estufa, deveriam ser zeradas

Por Bruna Bronoski
Do O Joio e o Trigo
Desde as primeiras críticas científicas aos combustíveis fósseis, as petroleiras saíram do status de “riqueza das nações” para “destruidoras do planeta”. Ou, na linguagem do mercado financeiro, se tornaram ivos ambientais.
Não se pode dizer, porém, que também se tornaram ivos econômicos. O mercado de créditos de carbono global anda tão aquecido quanto o planeta, e as petroleiras — sim, elas — estão entre os principais interessados em alavancar esse negócio.
Entre os maiores produtores de petróleo do mundo, países da Península Arábica, como a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos, se associaram à brasileira Minerva Foods, gigante brasileira do processamento de carne, atrás só da JBS em receita líquida. Subsidiária da Minerva, a MyCarbon 3 Ltda foi criada em 2021 para este único fim: gerar e vender créditos de carbono.
Créditos de carbono podem ser vendidos no mercado futuro, como ocorre com qualquer outra commodity na bolsa de valores. A exemplo da soja, um produtor não precisa ter as sacas do grão colhidas para vendê-las no mercado financeiro. Ele promete entregá-las em determinado prazo, negociando-as a um preço favorável ao comprador, que confia na entrega futura do produto. O contrato de compra e venda do ativo garante um preço ao produtor, que por sua vez possui segurança para plantar a safra.
Os projetos da empresa, no entanto, são pouco transparentes. Eles estão em processo de validação pela maior certificadora global, a Verra. Propõem a recuperação de pastagens degradadas no Cerrado, área onde está parte de seus fornecedores de gado e que já perdeu metade da cobertura natural. O principal causador do desmatamento nesse bioma é a atividade que alimenta os frigoríficos da Minerva, a agropecuária.
As parcerias entre petroleiras e empresas geradoras de crédito de carbono surgem como uma tendência global.
Em 2022, a Shell investiu R$ 200 milhões na Carbonext, uma desenvolvedora de projetos REDD+ (projetos de carbono em florestas). O aporte da petroleira garante o preferencial aos créditos de carbono que a Carbonext gera na Amazônia brasileira, compensando as emissões dos negócios com combustíveis fósseis. Mas essa parceria mancha a multinacional, já que projetos da Carbonext são investigados por violação de direitos contra povos quilombolas e indígenas.
Assim como a MyCarbon e a Carbonext, a CarbonCo vendeu créditos de carbono para a Petrobras. Em poucos meses, o desmatamento evitado que a petroleira brasileira anunciava como justificativa da compra dos créditos caiu por terra: a floresta não permaneceu protegida desde a negociação. A Petrobras havia criado a gasolina carbono neutro por ter comprado créditos de carbono do projeto Envira Amazônia, mas a área de “compensação” apresentava aumento do desmatamento desde 2017.
“Não é para vender petróleo com ou sem crédito de carbono. Crédito de carbono deveria ajudar [a compensar] algumas atividades que são difíceis de abater, mas certamente não é para ajudar petroleira”, critica Shigueo Watanabe, pesquisador do ClimaInfo com mais de 20 anos de experiência no mercado de carbono. Ele alerta para o fato deste mercado estar servindo a uma atividade que deveria ser reduzida até chegar ao ponto de extinção, como a extração e a queima de combustíveis fósseis.

A empresa tem dois modelos de negócio, um de comercialização de projetos de carbono originados externamente, por outras empresas; e outro de originação de créditos de carbono a partir de projetos agropecuários e florestais. Segundo a MyCarbon, os créditos vendidos a empresas do Oriente Médio fazem parte do primeiro negócio.
A Minerva Foods não possui uma cadeia de suprimentos livre de desmatamento. A empresa informa que não rastreia seus fornecedores indiretos, o que só deve atingir em 2030. Não faltam exemplos de violações cometidas por fornecedores indiretos do frigorífico.
Fazendas ocultas de geração de créditos
Dois projetos de carbono da MyCarbon aderem a duas metodologias da certificadora internacional Verra. Uma é a de melhoria de gerenciamento de terras agrícolas, que prevê o manejo sustentável de pastagens, como a recuperação e a manutenção de pastos degradados. Nesse caso, o documento descritivo do projeto deve conter informações que especifiquem a área das unidades de quantificação, isto é, da única ou das múltiplas áreas em que haverá medição de carbono estocado ou ações de redução de emissões.
A outra metodologia prevê reduzir emissões com base em uso de ingredientes na ração dos animais, já que, naturalmente, os bovinos produzem metano — o gás de efeito estufa mais nocivo à questão climática — pela fermentação do alimento que ingerem.
O VSC Standard, guia que padroniza informações para projetos de Agricultura, Floresta e Outros Usos da Terra, exige, já no projeto inicial, o registro de arquivos geoespaciais que identifiquem as poligonais das propriedades onde serão originados os créditos, de forma a “facilitar o monitoramento, a geração de relatórios e a verificação precisa” da proposta.

Nos dois projetos da MyCarbon em processo de validação pela Verra, porém, a subsidiária da Minerva não seguiu estas regras. Chamado de “Agricultura Regenerativa Brasileira para o Crédito de Carbono do Cerrado”, ou BRA-3C, o projeto registrado pela MyCarbon para começar a produção de créditos em 1º de janeiro de 2024 apresenta informações incompletas e confusas sobre a localização das áreas.
O resumo no sistema da Verra indica que a área incide sobre 500 mil hectares. Já no documento descritivo, a MyCarbon informa que a área inicial do projeto é de 1.193 hectares, 419 vezes menor que a primeira referência.
Num terceiro dado público, este geolocalizado, a MyCarbon declarou 200 milhões de hectares para a área total do projeto, exatamente o perímetro do bioma Cerrado, que corresponde a 21% do território brasileiro.

Ainda, uma auditoria contábil da Minerva de 2024 afirma que o projeto BRA-3C possui 590 mil hectares prospectados, sendo que 20 mil deles já estão em desenvolvimento.
O Joio conversou com pessoas que analisam usualmente projetos de carbono, entre especialistas e jornalistas que cobrem o tema. Elas disseram que, enquanto projetos estão em processo de validação, como é o caso dos projetos da MyCarbon, a empresa pode incluir tais informações ao longo do processo. Mas também apontaram que projetos transparentes trazem esses dados desde as primeiras fases de registro.
“Quando você submete o projeto, você não precisa colocar toda a área, porque ele é programático, [o que significa que] a cada ano eu posso adicionar novas áreas. Mas a transparência deveria acontecer”, ressalva Renato Rodrigues, head de Agribusiness na TerraDot, startup americana-brasileira que trabalha com uma metodologia de projetos de carbono para agropecuária diferente da proposta pela Verra, a ERW.
A Verra recebe, durante um período determinado, contribuições e opiniões de terceiros sobre o conteúdo dos projetos descritivos. Um comentário de fevereiro deste ano aponta falta de clareza e omissão de informações em vários trechos do projeto de 295 páginas da MyCarbon. A reportagem tentou contato com o autor do comentário por meio da Verra, que informou que todos os comentários “permanecem anônimos, a menos que a pessoa que os escreveu peça o contrário”.
O comentarista critica a ausência de identificação de fazendeiros que, segundo a MyCarbon, já têm contrato assinado de participação no projeto. Eles não estão listados no projeto descritivo como “partes interessadas”, tampouco como “outras instituições envolvidas”.
Deduz-se que o projeto tenha o Tocantins como uma das regiões de abrangência — que tem quase 90% de seu território sobreposto à área do Cerrado —, já que a MyCarbon elencou a Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do estado (Semas-TO) entre as partes interessadas. O estado tem discutido o mercado jurisdicional de carbono, em que projetos são desenvolvidos pelo setor público com ações de redução do desmatamento e de queimadas, podendo ou não envolver o setor privado.
Em resposta ao pedido de Lei de o à Informação, a Semas-TO informou que recebeu apenas uma “breve descrição do projeto”, que desconhece as informações da área de abrangência e que não fechou contratos com a MyCarbon. O estado do Tocantins ainda questionou quem assumiria possíveis riscos reputacionais do projeto, ao que a empresa respondeu que os riscos “podem ser compartilhados entre a MyCarbon e o produtor rural, conforme os termos do contrato de parceria”, documento a que a Semas não teve o.
O BRA-3C é criticado também quanto à adicionalidade, fator imprescindível para qualquer projeto de carbono. Ter adicionalidade significa que há uma comprovação de que, sem determinado projeto, não haveria uma redução nas emissões. Nesse tipo de situação, significa dizer que a área protegida de desmatamento está além daquilo previsto como obrigatório na legislação, como reservas legais e áreas de proteção permanente.
Para o comentarista anônimo, a argumentação de adicionalidade “é frágil”, uma vez que a MyCarbon não apresenta uma análise para identificar se os donos das fazendas adotariam práticas de manejo do solo mesmo sem a existência do projeto.
“Práticas como rotação de culturas, cobertura vegetal para evitar solo exposto e eficiência no uso da água já são amplamente adotadas na agricultura brasileira, especialmente no Cerrado, onde se encontram os maiores produtores de grãos do país”, escreveu.
O projeto da MyCarbon prevê originar créditos de carbono até dezembro de 2043. Questionada sobre a falta de informações neste projeto, a Verra informou que o proponente deve levar em consideração todos os comentários antes de seguir com o processo de validação.
O Renove ALM Brazil é outro projeto de carbono da Minerva, este em parceria com a Biofílica Ambipar, empresa que oferece serviços de descarbonização. Entre os clientes da Ambipar estão a produtora de cigarros Philip Morris; a empresa de aviação Latam; bancos como o Itaú, o Santander e o Banco do Brasil; entre outros. O período de originação dos créditos do Renove em propriedades privadas com criação de gado é de 30 anos, de 2023 a 2053.
A MyCarbon e a Ambipar dizem pretender aplicar o projeto em quase 350 milhões de hectares, o que representa 41% do território brasileiro.

Neste caso, diferente do BRA-3C, a Minerva aponta quais fazendas farão parte do projeto, mas omite a identificação precisa das áreas.
“Ele [o projeto descritivo] tem que identificar claramente, para qualquer sujeito digitar aquela centena de números, tem que aparecer no mapa claramente onde é a propriedade”, explica Shigueo Watanabe, do ClimaInfo. “Se tiver dez propriedades nesse projeto, tem que ter as coordenadas geográficas das dez propriedades.”
Ao contrário, o projeto da MyCarbon lista cinco propriedades rurais privadas, fornecedoras da Minerva Foods, sem a localização das fazendas. A ausência desta informação também foi registrada por um comentário no sistema da Verra.
Os projetos de carbono levam entre um e três anos para começarem a gerar os primeiros créditos. Depois da fase de comentários públicos, uma empresa de auditoria certificada pela Verra deve analisar o projeto. O proponente tem a chance de melhorar a proposta, até que atenda aos requisitos do sistema. Enquanto todo esse processo está só no começo, a MyCarbon aproveita para vender outros créditos de carbono que não têm nenhuma conexão com a indústria da carne.

A união lucrativa entre carbono e mercado financeiro
A MyCarbon nasce com mercado comprador garantido. Seus principais parceiros para dar vazão aos créditos de carbono são potências petro-econômicas do Oriente Médio que já controlam a processadora de carnes brasileira.
Entre os interessados no produto da MyCarbon estão um Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita, o PIF, e o Mercado Financeiro de Dubai, o DFM, que vende créditos de carbono para empresas que desejam compensar suas emissões.
Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos (EAU) têm como principal premissa expandir o capital de algumas poucas famílias por meio da exploração de petróleo. A primeira é membro-fundador da Opep, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo, criada em 1960. Sete anos depois, os EAU aderiram à organização. Ambos figuram entre os dez maiores produtores de petróleo do mundo. A Arábia Saudita no pódio, em segundo lugar, só atrás dos Estados Unidos; enquanto os EAU disputam com o Brasil a 7ª posição nos últimos dois anos.
Lideranças globais dos combustíveis fósseis, elas não pretendem parar tão cedo. E, se não há freio para a exploração, dá para aderir ao mercado de carbono, apostam os dois países.
Chamado de “Arábia Saudita do mercado de carbono”, o Brasil é a ponta final da cadeia de créditos de carbono oriental, um esquema hierárquico em que famílias sauditas ficam no topo, e a Minerva, também de origem familiar, na base.
O Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita (PIF) detém, entre outras dezenas de subsidiárias, a Companhia Saudita de Investimentos Agrícolas e Pecuários (SALIC), um fundo soberano saudita. Como braço das commodities do PIF, a SALIC possui a maior parte das ações da Minerva.
Tendo comprado parte da companhia em 2015 e aumentado seu controle nos anos seguintes, ultraando o poder de voto dos próprios fundadores, a SALIC também compõe o quadro de acionistas da outra empresa da Minerva do setor de carnes, a Australian Lamb Company Pty LTd.
Por sua vez, como subsidiária da Minerva Foods, a MyCarbon satisfaz o fundo público saudita, principal acionista do grupo e grande investidor em vários setores, entre eles o petroleiro.

Em 2022, a desenvolvedora de projetos de carbono bancou boa parte do fornecimento de créditos de um leilão saudita só um ano depois do início de suas operações.
“A MyCarbon vem se tornando um dos principais players no mercado de créditos de carbono no mundo, firmando relevantes parcerias”, informou o relatório de sustentabilidade da Minerva daquele ano.
“No leilão realizado em outubro de 2022 pelo Fundo Soberano da Arábia Saudita, a subsidiária foi responsável por cerca de 20% de todos os créditos negociados. Este foi o maior leilão do mundo de créditos no mercado voluntário, e o primeiro no Oriente Médio, tendo registrado a comercialização de mais de um milhão de toneladas de gases de efeito estufa na forma de créditos de carbono auditados e certificados”, em que voluntário se refere ao mercado impulsionado por empresas, que difere do mercado regulado, em que países definem metas de descarbonização por meio de regulação.
Os créditos negociados foram organizados pelo Regional Voluntary Carbon Market Company (RVCMC), outra subsidiária do PIF que lançou uma plataforma de negociação do mercado voluntário de carbono. Segundo o RVCMC, a Arábia Saudita pretende se tornar “um dos maiores mercados voluntários de carbono do mundo até 2030”.
A reportagem pediu à MyCarbon a identificação dos projetos “auditados e certificados”, mas não obteve resposta. Já o PIF respondeu ter comprado créditos de carbono da subsidiária da Minerva a partir de projetos de energia renovável desenvolvidos no Piauí, pela Auren Energia, e na Argentina, pela YPF Energia Electrica.
Por meio de sua subsidiária, de um lado, a Minerva vende créditos de carbono que am longe da produção de carne para sua controladora final. De outro, a empresa anuncia créditos de carbono a partir de recuperação de pastagens que, mesmo sem existirem ainda, já servem para posicioná-la como “sustentável” no mercado.
No final, todo mundo lucra, avalia Watanabe, do ClimaInfo. “O fundo saudita não vai gastar dinheiro, ou muito pouco. A MyCarbon vai ganhar dinheiro para fazer esse projeto. E a Minerva vai ganhar também, porque tem uma carne com uma menor pegada de carbono, ainda sai bonita na figura, porque está reduzindo emissões.”
Os Emirados Árabes Unidos também contam com a MyCarbon para impulsionar mercados de carbono voluntários.
O Mercado Financeiro de Dubai, ou DFM, possui três fornecedores de crédito de carbono, dois do seu próprio país, o Dubai Electricity and Water Authority e o First Abu Dhabi Bank. O único estrangeiro é a subsidiária da Minerva. Na prática, o mercado de capitais de Dubai injeta recursos de investidores em projetos de carbono.
Em 2023, o DFM anunciou o comércio de créditos de carbono que seriam fornecidos pela MyCarbon.

O histórico do Mercado Financeiro de Dubai não é sustentável, no entanto. O DFM conta com sete projetos-piloto, sendo três deles criados na área da Amazônia brasileira. Desse total, dois foram alvo da Operação Greenwashing da Polícia Federal em 2024, que identificou fraudes e casos de grilagem no processo de geração de créditos de carbono. Os projetos de REDD+, ambos certificados pela Verra, foram investigados por lavagem de madeira, prática que consiste em tentar legalizar o produto oriundo de desmatamento ilegal.
Em junho de 2024, a Verra suspendeu a emissão de novos créditos e qualquer processo em andamento ligados ao proponente. Mesmo assim, eles ainda estão expostos na prateleira do DFM para, conforme diz o site, “ajudar os Emirados Árabes Unidos a alcançar o Net Zero [balanço de emissões zerado] até 2050”.

Os créditos de carbono estão sendo tratados como ativos financeiros em bolsas de negociação na capital dos Emirados Árabes, mercado sedento pelo produto de países como o Brasil.
O Joio pediu ao DFM a identificação dos projetos de carbono da MyCarbon e perguntou se houve comercialização de créditos derivados destes projetos. Até a publicação da reportagem, não tivemos nenhum retorno.
VM0042, a metodologia para pastagens
A metodologia da Verra VM0042 é a linha de base para a criação de um projeto de carbono que será submetido a esta certificadora. Para a reforma de pastagens, a VM0042 foi lançada em 2020 e escolhida pela MyCarbon para gerar créditos no Cerrado brasileiro.
Para haver benefícios climáticos de estoque de carbono no solo, a proposta da metodologia é reformar pastagens degradadas, isto é, revolver a terra compactada e melhorar a adubação e a qualidade do solo, o que pode ser feito em poucos meses com investimento em uso de máquinas e insumos.
Segundo o especialista em carbono de pecuária e CEO da CarbonPec, empresa que estrutura projetos de carbono, Laurent Micol, há maneiras efetivas de obter estes benefícios climáticos.
“Quanto à pastagem, uma vez reformada, uma vez implantada em um bom manejo, vai acumular matéria orgânica no solo ao longo do tempo, acumular carbono orgânico no solo”, afirma.
Após o processo de reforma da pastagem, é preciso monitorar as atividades da propriedade ao longo dos anos de geração de créditos de carbono. “Não tem geração de crédito de carbono com base no PD [projeto descritivo]. Tem geração de crédito de carbono com base no que acontece na prática”, resume Micol.
Este período de monitoramento que se segue à implementação do projeto não é livre de controvérsias.
Críticos apontam que a VM0042 foi criada para climas temperados, o que não é o caso do Brasil, e para um sistema de contabilização simples, aplicável para emissões de GEE em indústrias ou em atividades de transporte, setores em que o benefício pela troca do tipo de combustível ou de uma máquina mais poluente por outra menos poluente é facilmente contabilizável.
“Na agricultura isso é tudo muito mais complexo. A gente tem um sistema totalmente aberto, dependente das variáveis climáticas, do manejo do produtor, do tipo de solo… quando a gente faz uma coleta de carbono num ponto e coleta 50 metros do lado, já vai ser um solo completamente diferente”, questiona Rodrigues, da TerraDot. “As metodologias são extremamente novas, tem muita pesquisa ainda para ser feita, a gente não tem certeza absoluta de todos os processos.”
“Fixar carbono no solo é um mistério ainda”, concorda Watanabe, do ClimaInfo. “A minha sensação é que é um território ainda desconhecido. Vai tirar CO2 da atmosfera e fixar no solo? Vai. Quanto e por quanto tempo? Não sei.”
Rodrigues também questiona os prazos de contrato para projetos de carbono com base nessa metodologia. O BRA-3C prevê 20 anos de operação, e o Renove, 30 anos. “Que pessoa em sã consciência vai um projeto de contrato para esse período? Uma coisa totalmente nova, com uma grande empresa, uma multinacional?”